A Linha dos Malandros na Umbanda
- Casa de Caridade Gauisa
- 10 de fev. de 2021
- 3 min de leitura
Nas Umbandas de hoje, a Linha dos Malandros tem presença certa em quase todos os terreiros, representada principalmente por Zé Pilintra (ou Zé Pelintra), dentre outros.
A origem destas entidades de luz está no Catimbó, um culto mágico-religioso proveniente dos nativos da Região Nordeste do país, que ainda resiste aos dias de hoje em grupos de famílias antigas de indígenas, não obstante a violência de todo o processo de colonização. Trata-se de um culto híbrido que sofreu grande influência das práticas indígenas, em especial, mas também de ritos da espiritualidade européia e africana, a partir do século XVI.
Na língua tupi-guarani, catimbó significa “fumaça de mato” ou “vapor de erva”, revelando que esta “religião” brasileira, também chamada de Catimbó Jurema ou Jurema Sagrada, já trabalhava com um dos elementos mais presentes nas casas umbandistas: o tabaco. É importante esclarecer que a queima do “tabaco” é um importante instrumento de limpeza espiritual.
Em geral, os malandros e malandras se manifestam nas chamadas linhas de esquerda ou nas giras de Exus, apesar de, atualmente, já constituírem uma força energética diferente e independente das demais.
A Linha dos Malandros traz no seu arquétipo a figura de uma entidade que é muitas vezes incompreendida por aqueles que desconhecem os mistérios da espiritualidade e da Umbanda. Sua roupa fluídica indica, geralmente, a imagem de uma entidade que usa roupas elegantes da década de 1930, terno de linho branco, chapéu panamá, sapato bicolor (branco e vermelho), além da gravata vermelha. Via de regra, os malandros se apresentam com muita alegria, simplicidade, jogo de cintura, bom humor e malandragem.
E é justamente neste ponto que a polêmica se inicia com relação a tais entidades espirituais, já que muitas pessoas só levam em consideração a “malandragem” em seu aspecto negativo.
Apesar da incompreensão, não há dúvida de que as entidades desta linha de trabalho dão voz ao povo marginalizado e excluído. Porém, em vez de mostrar revolta e raiva com tal situação, traz como ensinamento principal a leveza e a alegria para encarar as dificuldades da vida, com bom humor, resignação, mas sem esmorecimento na lida diária.
Neste particular, fica evidente que os malandros e malandras da Umbanda atuam no padrão vibratório de dois grandes Orixás: Ogum e Oxalá. A irradiação de Ogum se faz presente justamente na face guerreira da entidade, que luta diariamente contra o preconceito e busca um reconhecimento social, apesar de sua condição de marginalizado. Já a irradiação de Oxalá se mostra presente na sua fé inabalável na espiritualidade maior, destacada na sutileza, simplicidade, humildade e bom humor com que encara seus desafios.
Mais uma vez, a Umbanda vem para dar voz aos espíritos estigmatizados, discriminados e marginalizados da sociedade, assim como aconteceu desde a sua fundamentação, com a vinda do Caboclo das Sete Encruzilhadas pela mediunidade de Zélio Fernandino de Moraes, em 1908.
O grande representante desta linha de trabalho é o famoso Zé Pilintra, como já mencionado anteriormente. Seu figura foi tão marcante, que inspirou o personagem Zé Carioca, da Walt Disney. O arquétipo do Zé Pilintra está baseado na história de um pernambucano, conhecedor dos segredos da Jurema, que veio para o Rio de Janeiro após perder sua família para uma grande seca que devastou a região nordeste. Criado na rua, no meio da boemia e da vida noturna, aprendeu a usar da malandragem para se desvencilhar de toda dificuldade que encontrava, tornando-se exímio jogador de cartas e hábil com facas, num cenário de surgimento das favelas cariocas. Seu caminhar se parece com uma dança, sendo este o momento em que atua na limpeza espiritual daqueles que o procuram nos terreiros de Umbanda. Vale lembrar que, no Catimbó, Zé Pilintra é curador e um Mestre da Jurema muito respeitado.
Os espíritos que atuam na Linha dos Malandros vêm nos ensinar sobre nossa capacidade de adaptação e evolução, apesar de todas as dificuldades enfrentadas em nossas vidas, encarando os desafios e adversidades com muito bom humor e jogo de cintura, num clima que parece ser sempre de festa. Alguns nomes de entidades desta linha são: Zé Pilintra, Maria Navalha, Maria do Cais, Zé Malandro, Zé Pretinho, Malandrinho, Sete Navalhas, etc.
Na Casa de Caridade Gauisa, ainda não temos uma gira inteiramente dedicada as entidades desta linha de trabalho. Em geral, elas se apresentam nas Giras de Exus, em trabalhos de atendimento e passe.
Salve a Malandragem!!!